O modelo político e eleitoral do Brasil possui virtudes. Ele conta com um sistema de votação e apuração rápido e eficiente que é motivo de admiração no mundo e que está sendo adotado em outros países. Ele está passando por aperfeiçoamentos. Por exemplo, o sistema de digitalização da identificação do eleitor, está em fase de implantação.
Dispomos também de um sistema de repartição do tempo de rádio e TV, destinado à propaganda eleitoral e partidária, que assegura uma justa distribuição proporcional entre os partidos.
O nosso sistema proporcional para a eleição de deputados é justo e democrático. Ele, quando aplicado com rigor, faz prevalecer o princípio democrático de que a cada eleitor deve corresponder um voto. Quer dizer, ele procura fazer com que um partido que obtém 15% dos votos, obtenha também 15% das cadeiras, como é lógico.
O pacote de abril de 1977, da ditadura, no entanto, ampliou uma deformação neste sistema, que mais tarde foi infelizmente
aprofundada pela Constituição 1988, que estabeleceu no se artigo 45 § 1° que cada estado terá no mínimo oito deputados e no máximo 70 deputados. Este dispositivo cria uma distorção. É preciso corrigi-lo, para evitar que as populações de determinados estados continuem super- representadas na Câmara, enquanto as populações de outros estados são sub-representadas.
Nos sistemas distritais não existe simetria entre a proporção de votos obtidos por cada partido e o número de cadeiras conquistadas no parlamento. Em tese, pode ocorrer de um partido, que obteve 49% dos votos em todos os distritos, vir a ser excluído do parlamento, se outro partido obtiver 51% dos votos em todos os distritos.
Na prática, o sistema distrital provoca distorções graves. Dou exemplos do mau funcionamento do distrital, tirados do livro "Sistemas Eleitorais", de Jairo Nicolau, cientista político.
Veja as eleições no Canadá/1993: "O Partido Conservador, que obteve 16,0% dos votos espalhados pelo território, elegeu apenas dois deputados, enquanto o Bloco de Quebec, com votação concentrada (13,5%) elegeu 54 deputados. O Partido da Nova Democracia, com apenas 6,9% dos votos, elegeu nove deputados". Isto mostra que o sistema distrital é incongruente e permite que uma minoria social seja representada por uma maioria parlamentar. Isto não é democracia.
Nicolau cita também as eleições na Austrália/1996: "Os trabalhistas, que receberam 38,8% dos votos, ficaram com 33,1% das cadeiras, enquanto os Liberais, com 38,7% dos votos, obtiveram 51,3% da representação parlamentar." Mais uma minoria social se apropriando de uma maioria parlamentar. Artes de um sistema eleitoral caduco.
Cito agora um resultado da última eleição realizada no Reino Unido, 6 de maio de 2010. O Partido Trabalhista obteve 29,0% dos votos e elegeu 39,69% dos representantes. O Partido Liberal Democrático obteve 23,1% para arrancar apenas 8,76% das cadeiras. Lá este tipo de incongruência perdura desde 1948.
Mas agora há sinais de progresso. Para formar um governo de coalizão com os liberais, os conservadores prometeram uma consulta à população, marcada para maio, sobre a conveniência de mudar o sistema. Vale torcer para que a população britânica adote a proporcionalidade em seu sistema e construa um parlamento plural.
Está provado que o distrital é feio. Se é verdade, como ensina Millôr Fernandes - que quem ama o feio tem objetivos sinistros, devemos nos afastar das fórmulas mágicas embaladas em discursos enganosos, como são os discursos que tentam vender o sistema distrital. O "distritão" é uma mistificação ainda mais grosseira e representa uma ameaça à democracia ainda mais grave que o distrital puro e simples. Voltaremos a tratar do "distritão".
Artigo publicado no jornal "O Popular" (Goiânia em 26. 03. 2011)
Marina Sant´ana é deputada federal (PT-GO)
Athos Pereira é assessor político da Bancada do PT
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